Mighty

There’s a place dark and moist
Inside the inner most of my heart
An empty room with no art
Where my soul has gone lost.
It is there with your shadow
Where we stand in a narrow
Close and tight makes it bright
Deep feeling of love and light
There, a small bit of you is all mine
Yet The most important and fine
And in the silence we’re one

I’ll keep this with me
For as long as I shall be
Gives strength for the fight
To inhale this your might

AB

A Ausência e a Dúvida – um conto sobre o amor que nunca foi e seus frutos (uma análise da auto obsessão e do monoideísmo)

(English)

E naquele momento ela ficou paralisada. Algo lhe percorrera o corpo, fosse veneno ou alguma toxina que lhe era própria, verdade é que a deixou num estado tal que suas faculdades já não mais funcionavam. A sombra da então gigante Dúvida era incontestavelmente o que a obsidiava, no entanto, Ausência aproveitava-se de seu estado debilitado para desferir-lhe o golpe fatal. Não vê-lo novamente estava muito além do remanescente de suas forças já débeis.

Elas, a Dúvida e a Ausência, há muito haviam crescido e de amigas-irmãs se revelaram cruéis madrastas. De início, na medida do impossível, aprendera a conviver com elas. Logo que nasceram, colocou-as na edícula de sua alma, alimentando-as a cada dia. Acreditava que depois de ter permitido que elas nascessem, deveria deixá-las viver, coexistindo e cocriando no mesmo tempo-espaço de seu eu. Imprudência pura. Não atentara para o fato de que ambas foram geradas a partir de pedacinhos cissíparos de suas próprias entranhas, assim, o dia chegaria em que não mais se contentariam com tal subjugo.

Pedacinhos cissíparos… Sim, também nós nos reproduzimos de maneira assexuada. Tal cissiparidade, invisível, ocorre da seguinte maneira: começa no âmago onde a força vital impulsionada por sensações e pensamentos adversos se rompe, e aquilo que alguns gostam de chamar de alma, dilacerada, divide-se em idênticos pedacinhos de si. Daí, tal como funcionários públicos dum governo inadimplente, o coração consente e o cérebro reitera. Atente-se, pois, que o comum nesse caso é que o indivíduo original, a alma, talvez não volte a se regenerar por completo, como na maioria das espécies de platelmintos, cnidários, etc. O que se segue é a gestação intracerebral: a partir do pedacinho mais resistente, um pequeno balão-ovo vai se formando para que, uma vez quebrada a casca, o filhote-aflição seja liberado, verticalmente. Rumo aos céus deve seguir. Muitas vezes, no entanto, o pior acontece. Um mórbido orgulho parental ou até um equivocado senso de responsabilidade não permite que se vá. Logo, a edícula e a manutenção do rebento. Adverte-se também que tal cria dificilmente pode ser vista pelos olhos que a terra há de comer ou o fogo consumir. Entretanto, alguns sinais latentes podem ser observados, ainda que com dificuldade até mesmo para o próprio genitor.

E elas cresciam, a Dúvida e a Ausência. Matá-las seria abrir mão do que já não tinha. Deixá-las ir, simplesmente impossível, principalmente agora que crescidas estavam maiores que a alma mãe. Sempre pensava duas vezes e desistia. Mas ali, bem ali, elas se mostraram soberanas. Venceram-na. Deixaram somente o que dela era o mais denso. Oco. Verdade seja dita, ela já havia podido sentir que esse momento chegaria e já havia, em êxtase e à distância, quase tateado com as mãos firmes de seus pensamentos torpes a sensação que agora a impossibilitava até de respirar.

Na ocasião do vislumbre agarrara-se à sua dileta, também cria d’alma, Esperança. Acreditava que num momento como esse, tal ninfa piedosa, atiraria em seu oceano lamacento algum tipo de bote salva-almas: enganou-se. Via-se só. Provava agora a verdade do dito popular. Sim, a Esperança seria a última a morrer. Não sabia por quanto tempo poderia aguentar a substância letal que lhe percorria as veias. Substância que ela mesma havia produzido e liberado por imprudência. Talvez.

Substância. Impossível deixar de examinar qual seria seu nome. Haveria de ser algo concreto o que agora transitava livremente por suas veias e adentrava seu sistema nervoso. E ela em sua inconsciência consentira que a dominasse por completo. Uma bile ou algo parecido. Quanto à inconsciência é impossível afirmar. Afinal, em estado germinal, não é incomum haver na alma fissípara somente uma impossibilidade frágil e frívola.

A verdade é que ele surgira à desavisada de maneira inadvertida e nada nunca pareceu tão certo. Assim como surgira, agora a deixava com algumas Pistas torturantes do sim e com sua Ausência e a Realidade infalível do não. Foi o suficiente para que elas, suas reais inimigas, a finalizassem. Se o fizeram sozinhas, não se sabe. Fora Esperança e seu irremissível descaso, talvez tenham contado com a ajuda da Realidade e das gêmeas Pistas, também suas crias mantidas em algum porão nos recônditos de seu ser pouco desbravado.

Alessandra Barbierato

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suspension: walking the tightrope suspended by thoughts. acrylic on cardboard. 2015

Escuro

sentei, e o escuro me rodeou. aos pouco foi tomando meus pés, subindo pelas minhas pernas. o breu era tanto que se alastrava em ausência. logo já não havia pé, e pela perna vinha destituindo-a da vida. duas eram e por duas vezes o breu correu. as mãos tão frágeis nem suscitaram relutar: deixaram-no passar. pelos braços subia sem parar. e não havia mais membros. pelos olhos veio então, destituindo-os da visão. congelava o cérebro já quase sem noção. mas o que fazer sem o pensamento? Já sei: me restará o coração. foi então que entendi porque o escuro me achara ali, não sem razão: ele sabia que era presa fácil pois me deixaste o peito oco e sem ação. IMG_20150606_020823

autorretrato no escuro sobre história, fotografia sobre grafite sobre papel, 2015

Má hora

Quero essa vida de dentro pra fora
fosse ou não fosse chegada a hora
quero que seja pra sempre agora
ainda que embora não saiba dizer
Disse o que pude dada a demora
de tudo o que passa e do por fazer
Queria que toda alegria do mundo
trouxesse pra junto fosse onde
fosse pra acontecer
Que seja dito o que não pude dizer
Que seja feito o que não pude fazer
porque no momento errado aflora
o que certamente era pra ser
Desisto por hora o que outrora
ninguém e nem nada há de deter

AB

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figura, oil on canvas. 2004

Fantasia

tentei despistar, tentei desfazer
tentei encontrar outra história
e viver
mas a vida tropeça na mente
que se arrasta de costas pra frente
sem poder perceber o abismo
que se abre por dentro da gente
e a ilusão que se forma dia-a-dia
agarramos com grande alegria
sem prever a fumaça que esfria
entre os dedos vazios de agonia

AB

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Oco

Amigo que foi incansável
tateava a dor no fundo sentido
expõe a razão de tanto zunido
sempre presente ao menos no ido
nesse peito de vida aparente
que pulsa entre altos e baixo
seco por dentro por vezes partido

AB

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esfera e flor, oil on canvas. 2006

Desaperto

Quero o fim dessa noite em aberto
que te tira e te leva de perto
quero o fim desse peito encoberto
do abraço o aperto mais certo
Vou voltar para ver se acerto
o predito futuro entreaberto
que boceja já quase desperto

AB

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la Seine, oil on canvas. 2005

Alcateia

Pois não vejo justiça na teia
que se arma inteiriça e ateia
presa que imóvel torna-se ceia
mas vale saltar-lhe na veia
ser de vida quebrada já meia
de quem a paz atormenta a alheia
liberta-se da mente cadeia
agitada que a todos odeia
e mesmo débil de dor anseia
calar aquele que a luz permeia

AB

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“figura”, oil on canvas. 2005

Dimensão

Nunca nada foi tão sublime
os olhos da carne distante
voltados ao cerne no instante
em que vê sua parte alheia
em outra carne a qual permeia
não há tato troca nem gosto
da carne não há combustão
do prazer da presença nada
quase senão instantes apenas
inflados de vida e o torpor do
amor mais intenso que existe
e a certeza selada por olhos do
toque invisível entre almas
habitantes do escuro da vida
onde de nada se necessita
habitantes de terra sem chão
onde não há moeda de troca
terra firme fecunda longínqua
reino prá lá da outra dimensão

AB

mar

“mar”, acrylic and marble dust on canvas. 2006.

Leste

Quero que o cerco do seu mar
feche sobre mim e esse azul
inunde-me a vida com a sua e
refaça-me em plena alegria
Quero que o cerco do seu ar
feche sobre mim tanto azul
e toque-me a pele da alma
com o frescor que tudo resfria
Quero que o cerco do seu fogo
arda sobre mim com seu azul e
tinja a tinta cinza da vida
de olhos de quem antes não via

AB

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“east road”, acrylic on canvas, 57×45. 2013

Les Multiples Demeures – small works, “sucumbência”, acrylic & ink on paper. 2014

sucumbencia

“sucumbência”, acrylic & ink on paper over wood. 2014.

A tez pálida e fria já não pode suportar
que as horas voem sem que rumo possa dar
ao ser que em seu limite mais estreme sente
a mente esvaindo-se semente em planta broto
de seu ventre infértil de amor carente
como muda cresce insistente meio ao lodo
encharcado de ternura e amor onipresente
e o choro permanente segue em torrente
quanto mais te mostras mais me embriagas
a falta cresce e de muda animal silvestre
condenado a correr à exasperação rupestre
arisco e indomável arrebatando a vastidão
da mente devastada sucumbida ao coração.

AB

Small works em detalhe

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Margaux and the dog: “repos”, mixed media. 2013

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Anita and a child in: “repos”, mixed media. 2013

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“potpourri dans le trou” detail, acrylic on cardboard. 2013

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“potpourri dans le trou” detail, acrylic on cardboard. 2013

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musing Margaux in: “the three tenses”, mixed media. 2013

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“le gauche” detail, acrylic on card. 2013

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the overfull, detail of “the three tenses”. 2013

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naughty angel in “planet love” , detail. 2013

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riding Margaux and “the rider”, mixed media. 2013

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“over the rainbow” detail, acrylic on canvas. 2013